sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Desculpas

É cômodo utilizar teses biológicas e antropológicas ("o homem é produto do meio") como desculpa para nossa resistência em vencer tendências ruins ou para explicar porque nos acomodamos. É fácil culpar o mundo, a sociedade, o capitalismo, o governo, a mídia, a criação que nossos pais nos deram, o trauma de infância, a Rede Globo, a Igreja Católica, os Illuminati, a Dilma Rousseff, a mãe, o pai ou o ex que nos fez sofrer. É prático justificar nossas próprias fraquezas com base na forma como o mundo se encontra hoje. É muito fácil fazer uso desta retórica de que a causa está fora de nós, e não dentro.

Quem opta por esse discurso parece não ter noção de que a sociedade precisa caminhar, e o mundo precisa tomar seu rumo, independente de como isso afetará particularmente a vida das pessoas. O tempo não para pra esperar que todos criemos um modelo perfeito de vivência. Enquanto cada um cuida de sua vida, o arcabouço social do mundo precisa existir para que este siga em frente; e em se tratando de um mundo de seres imperfeitos, como esperar que este arcabouço seja perfeito?

Passaram-se anos até que fosse montada toda esta estrutura que encontramos pronta quando nascemos, esta estrutura que influencia o nosso jeito de ser e agir. E, quando ainda não éramos vivos, as pessoas também eram atingidas por isto, as pessoas também reclamavam. Nunca houve, porém, um momento especial em que todos se uniram para reformular o conjunto de normas e princípios que paira sobre o mundo e afeta a todos que vivem nele. Nunca houve, porque é impossível que algo assim aconteça.

É utópico desejar que a sinfonia que rege o planeta se transforme toda de uma vez, e é estúpido esperar a chegada deste momento para enfim tomar uma atitude em relação ao que é preciso mudar em si mesmo. Pensar assim é ingênuo, é ridículo.

A única maneira de promover uma mudança significativa no mundo inteiro é cada habitante dele resolver mudar a si mesmo. Novamente, como é impossível exigir e garantir que todos façam isto ao mesmo tempo, a maneira mais viável é começar por si próprio. Foi isso que Ghandi quis dizer quando afirmou que "devemos ser a mudança que queremos ver no mundo".

É inegável que certas circunstâncias externas produzam efeitos intensos sobre nossas vidas e sobre nossas personalidades; porém, dizer que a a intensidade destes efeitos é tamanha a ponto de não sermos capazes de resistir, ou a ponto de impedir que ajamos de forma diferente, é uma ilusão, uma mentira contada por quem não tem coragem e determinação suficiente para colocar idéias em ação, um subterfúgio para quem prefere se acomodar, uma ladainha repetida por quem quer disfarçar a própria moleza.

Há pessoas que perdem anos de suas vidas com a incapacidade de vencer uma fraqueza, enganando a si mesmas com a idéia de que "nunca conseguirei mudar, as circunstâncias da vida me fizeram assim e sofrerei com isto para sempre". Quando enfim tentam fazer algo a respeito, fazem uma viagem superficial para dentro de si mesmos e, quando pensam ter descoberto a origem do problema, agarram-se a isso como justificativa para não mais seguir em frente. A cada estágio, uma nova evasiva. A cada avanço, uma nova desculpa para estagnar. 

Os fisiculturistas costumam dizer que "quem quer, encontra um jeito. Quem não quer, encontra uma desculpa". 

A verdade é que os problemas existem para serem resolvidos, e não para justificar ações ou inações. É mais fácil adotar uma postura de "incompreendido pela sociedade" e "produto do meio", do que efetivamente tentar modificar este panorama. 

Aqueles que, apesar de acomodados, são um pouco mais espertos, costumam agregar à estratégia da tergiversação uma outra: criar um argumento forte para convencer toda a sociedade de que realmente não se pode lutar contra certas coisas. Assim, todos ficam iludidos, e a negligência do indivíduo fica legitimada.

Convenhamos que lutar e fazer a diferença não é tão simples... É difícil, é imensamente difícil. De fato, é mais fácil ficar parado e arranjar um pretexto. Entretanto, há de se concordar também que é importante ser honesto consigo mesmo e com o mundo. Lutar ou esmorecer: cabe a cada um fazer a sua opção. Mas aquele que opta deve ter a coragem de assumir a sua escolha, para si e para os outros.


(Pergunta 872 do Livro dos Espíritos)

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