sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A famigerada maturidade

Às vezes, não sempre, eu olho para dentro de mim mesma, e quando me comparo com algumas pessoas da minha idade, acho-me ligeiramente mais madura. Talvez seja apenas um questão de ponto de vista, pois quando penso na forma como me comporto nas situações comuns que partilho com meus amigos e conhecidos, não acho que esteja passando a impressão de ser diferentes da maioria das pessoas. Provavelmente os outros também são assim: têm suas concepções e sua maturidade, mas não precisam ficar expondo-os o tempo todo; agem com sensatez quando é preciso ser sensato, e agem normalmente em situações normais; e é isso que penso deles, porque nunca estou com eles quando é hora deles provarem que são maduros.

Porém, não há como negar que mesmo entre um ou outro evento trivial da vida, por mais trivial que seja, nós deixamos pistas dos mais marcantes traços de nossa personalidade. E eu não vejo - ou ao menos não com tanta frequência - nas pessoas de nossa idade muitos contornos adultos. Eu sei que faz pouquíssimo tempo que encerramos a etapa da adolescência; contudo, esta é, seguramente, a transição mais rápida da vida. O mundo exige de nós que sejamos adultos antes mesmo que consigamos nos enxergar como tais. Por que não vejo tanta gente se sentindo pressionado desta forma como nós eu me sinto?

Lembro-me dos pensamentos que eu tinha quando era menina, da maneira como eu imaginava que seria quando eu tivesse a idade que tenho hoje. Tudo parecia muito distante e muito natural: ser adulto era saber tudo, ter um lugar no mundo e estar consciente disso; e eu realmente não imaginava que seria tão difícil. Talvez 'difícil' não seja a palavra certa, porque o que sinto hoje não é a arduidade, é apenas... A complexidade. 

Eu sempre imaginei que a infância e adolescência eram apenas etapas preparatórias para a idade adulta, como se esta fosse realmente a época em que a vida começava; e por pensar assim, preparei-me muito para o dia de hoje, para quando o hoje chegasse. Pois bem, chegou. De certo modo, posso dizer que já sou muito (não tudo, mas boa parte) daquilo que imaginava que seria, se levar em conta a imagem que passo. 

É difícil, para mim, aceitar que as demais pessoas não passaram todo o seu passado esperando pelo agora, pois esta foi a minha realidade, e é estranho ver que, provavelmente, só eu pensava assim. Talvez por isso só eu seja como sou. Nasci velha, e a cada dia que passo fico mais velha, sempre mais velha que os outros.

A verdade é que, de certa forma, sempre estive um passo à frente: mais madura do que os outros da mesma idade, sempre aparentando ser mais adulta, ainda que nem sempre em um sentido positivo. Mas e quando eu for realmente adulta, quando todos nós formos realmente adultos, qual será o meu mérito? Sou dramática ao já exigir de todos que ajam como adultos, pois o fato é que as coisas hoje já não são como antes, e mesmo a fase adulta tem ínsita em si uma infância. Mas vai chegar um dia em que essa infância vai passar, e aí sim todos estaremos no mesmo nível, os adultos-crianças passarão a ser totalmente adultos, e os adultos-adultos serão... Adultos. Do que poderei me vangloriar quando isto acontecer? Todos serão maduros, e eu também serei, com a diferença de que, desta vez, isto não será motivo de admiração. Serei apenas o que se espera que qualquer um da minha idade seja, e ninguém mais me achará distinta. 

Há sempre um mérito em estar adiante dos outros, mas no meu caso, o que há adiante que eu possa conquistar e que todos já não tenham conquistado? Não há nada. Meu mérito será ter chegado lá antes de todos, mas quando se passar um enorme lastro de tempo após todos terem chegado lá também, minha vitória nem terá mais brilho. Se é que um dia teve. 

É curiosa a forma como vejo que me encaixo nesta sociedade de hoje. Às vezes sinto que tenho vontade de gritar que sou diferente, que não sou igual a todos, que não sou fútil como os outros, que não tenho os mesmos gostos e que, ao contrário deles, tenho objetivos e princípios. Flagro-me contrariada por não  reconhecerem minha falta de juventude, minha distinção, minha superioridade. E em seguida, sinto-me ridícula por realmente crer que sou mesmo superior, que sou mesmo tão digna de homenagens. E quando alimento esta linha de pensamento, lembro-me de há alguns anos atrás a situação era exatamente oposta: tudo que eu queria ser considerada igual, normal. Minha distinção era gritante, e ela me excluía de tudo que era comum à minha época, e por causa dela eu mesma me excluía de tudo. O orgulho de já ter entendido tudo aquilo que os meus colegas ainda levariam anos para entender não era suficiente para evitar a tristeza de não ser contada, não ser aceita, não ser vista como alguém normal.

A vida é tão engraçada. Eu me esforcei para deixar de ser invisível, e quando finalmente fui vista, fiquei feliz por saber que seria possível conciliar as duas imagens. Consegui ser aceita, e melhor ainda, consegui ser reconhecida pelo que era. Era honroso ser diferente em meio aos normais. 

Porém, a diferença nem sempre é tão evidente quando está rodeada de normalidade. Eu não posso sair por aí com um cartaz que explique como eu sou, nem tenho um cartão para entregar a quem me conhece; logo, as pessoas me julgam pelo que vêem, e quem me vê geralmente não crê que eu tenha as ideias que tenho. A princípio, pode parecer ser legal esse efeito surpresa que causo aos que se dão o trabalho de me conhecer e descobrem que sou um pouco diferente do que pareço ser; mas, com o tempo, fui me cansando do peso de não ser reconhecida logo de cara. 

Hoje em dia, ninguém tem tempo para conhecer ninguém, e este fato gera em mim um ridículo desespero para provar a todos que eu sou muito mais do que a imagem que passo quando passo no meio da multidão. É ridículo, eu sei; e principalmente porque, há pouco tempo atrás, o meu desespero era pensar que eu nunca conseguiria fazer parte da multidão.

Dias atrás, vi uma entrevista com o ator Johnny Depp na qual ele disse: "Não vou agir diferente só para provar aos outros que sou diferente. Eu sou o que sou". Ele está certo. E eu estou errada. E eu sou tola, e muito, muito arrogante por nutrir essa gigante exigência de que todos me notem e me reconheçam; pois quando faço isso, erro duas vezes: erro ao crer, de verdade, que sou mesmo merecedora da atenção e do reconhecimento; e erro ao crer que todos aqueles que julgo inferiores e normais demais não tenham também um lado (ou muitos) digno do mesmo reconhecimento (ou de muito mais). 

O meu problema é que me superestimo e subestimo todos os outros. Parece que me esqueço, mas o fato é que a vida já me mostrou, diversas vezes, que eu não sou a única que evolui. Vanglorio-me tanto de estar um passo a frente de tanta gente, mas certamente não sou tão sábia quanto penso, pois uma pessoa sábia jamais acredita que suas qualidades precisam ser reconhecidas. Humildade: eis a lição que eu ainda preciso aprender.  

Talvez o meu problema seja estar tão preocupada comigo mesma quando finalmente chegar este dia em que todos tivermos amadurecido. Depois que todos nós tivermos passado por todas as etapas e tivermos adquirido a sabedoria que se espera de nós, é certo que não seremos mais o centro do mundo. Novas gerações virão, e será a vez de outros jovens serem jovens como nós fomos, e adultos como nós fomos, até chegarem onde estaremos. E depois o mesmo, e assim se repetindo sempre, em um eterno ciclo, pois este é o mundo, e esta é a vida.

Afinal, quando eu estiver velha, não deverei me preocupar em querer estar além de onde os outros estão, mas sim, em fazer o melhor uso possível de todo o conhecimento que acumulei ao longo da vida, para passá-los aos outros... Para passá-los àqueles que vierem de mim.

E que eu não superestime meu potencial, nem subestime meus desafios... E que eu me lembre sempre que humildade e autoconfiança devem caminhar juntas.

E se eu vencer, que não queira levar todos os créditos sozinha. E se eu perder, que não queira colocar a culpa em todos exceto eu própria.

E que eu tenha força para correr atrás dos meus objetivos e lidar com os resultados, sejam eles quais forem; porque a gente está nessa vida é para isso mesmo: para dar a cara a tapa.

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