segunda-feira, 18 de julho de 2011

As mulheres e o sexo

No texto "Psicologia, amor e sexo nas séries de TV", mencionei uma engraçada passagem do seriado brasileiro "Macho Man" no qual a personagem Valéria afirma, sem ironia, que "mulher não gosta de sexo; mulher gosta de homem". Ainda segundo a personagem, como homem gosta de sexo, mulher acaba aceitando o sexo também, afinal, ela quer o homem, mas o sexo "vem no pacote". 

É engraçado e tudo o mais; quando assisti, eu dei risada, mas depois, flagrei-me pensando nesta teoria. Muitas reflexões, pesquisas e leituras depois, inevitavelmente concluo que, por mais louca e cômica que pareça, esta premissa tem lá seu fundo de verdade.

Eis a conclusão a qual cheguei: ainda que não seja verdade que nenhuma mulher aprecia o ato sexual, há de se admitir que o fato de a mulher ter entendido o que o sexo representa para o homem fez com que ela repensasse e modificasse a sua própria forma de encarar o sexo, bem como, de usá-lo.

A mulher aprendeu a usar o sexo a seu favor. Após séculos e séculos de repressão, infelicidade conjugal e sexual, sofrimentos com traições e amores não correspondidos, tudo isto somado à expansão dos estudos a respeito da sexualidade feminina e masculina, com ênfase nas diferenças entre uma e outra, finalmente a mulher compreendeu que sexo, para o homem, representa algo diferente. 

Ainda há mulheres que relutem, mas a grande maioria já compreende e aceita que o homem é naturalmente mais inclinado ao sexo, bem como, que o sexo, para o homem, constitui verdadeira necessidade física, afinal, a ciência, a antropologia e a história nos ensinam que seu corpo foi dotado com desejo e capacidade de fecundar várias fêmeas, com o objetivo de perpetuar sua espécie. 

É claro que não se pode conceber o homem apenas nesta perspectiva animal-biológica, dissociada do elemento moral, psicológico e emocional; afinal, mesmo o homem mais sexualmente faminto é capaz de amar, manter um relacionamento amoroso estável e ser fiel. Todavia, tal explicação (a científica e histórica, que define o homem conforme sua função de reprodutor e perpetuador da espécie, criando assim a figura do "macho alfa") satisfaz a necessidade da mulher de entender porque o homem gosta e precisa de sexo mais que ela, assim como, satisfaz seu interesse em entender porque os homens estão tão mais propensos à infidelidade.



O sucesso de livros como "Por que os homens fazem sexo e as mulheres fazem amor?", best seller de Alan e Barbara Pease, pode ser um indicativo de quanto a mulher tem buscado cada vez mais entender estas questões, as quais são muito bem explicadas neste livro.

O fato é que, uma vez tendo a mulher entendido o quanto o sexo é importante para o homem, ela aprendeu a usar isso de forma a favorecer a si mesma. Não são poucos os casos, na história, de mulheres que usaram o sexo para ascender socialmente ou conseguir o que queriam: podemos citar Teodora, a prostituta que conseguiu casar-se com o imperador bizantino Justiniano I e depois aproveitou-se disso para influenciá-lo politicamente; e Mata Hari, a dançarina de beleza exótica que, reza a lenda, dormia com oficiais durante a I Guerra Mundial para conseguir informações secretas. Ademais, no dia a dia e nas novelas, não faltam exemplos de mulheres que dormem com homens ricos para conseguir usufruir de suas riquezas também.

Eu posso citar o filme "Baby Face", de 1933, estrelado pela minha atriz predileta: Barbara Stanwyck. Neste filme dirigido por Frank Capra, a personagem Lily Powers aprende a manipular os homens e conseguir deles o dinheiro que tanto almeja, fazendo uso do sexo. Dorme com vários homens até conseguir bons cargos na empresa em que trabalha, e depois, conseguir bons casamentos, para viver com luxo sem precisar trabalhar.

Este filme é muito interessante. Imaginem qual não foi a repercussão que esta história causou à sociedade daquela época, nos conservadores Estados Unidos pós-quebra da Bolsa de 1929... É claro que, mais tarde, com o advento do Código Hays (código que impunha às produções cinematográficas uma série de restrições, de forma a preservar "a moral", em respeito ao pudor daquela pudica sociedade), em 1934, o filme foi censurado.

Lily Powers, desde a infância, trabalhou no bar de seu pai, convivendo com homens sujos e bêbados que tentavam aproveitar-se dela. O filme não cita, mas certamente Lily já foi alvo do abuso destes homens. Cresceu com essa ideia de que homens são broncos, estúpidos, ignorantes e animalizados, que só pensam em sexo e bebida e são incapazes de cultivar sentimentos nobres ou absorver qualquer tipo de cultura. Mais tarde, aprendeu que podia beneficiar-se desta rudeza, usando a sua melhor arma, a única que eles poderiam querer de uma mulher: a beleza, o corpo, o sexo.

A cena-chave do filme é também a mais forte: um senhor (não me lembro que personagem era) diz a Lily que ela pode ir muito mais longe, subir na vida, ser alguém. Confusa, Lily diz: "Que chances uma mulher tem?". E ele a responde: "Mais chances que um homem. Uma mulher jovem e bonita como você pode conseguir tudo que quiser, porque você possui poder sobre os homens. Mas você tem que usar os homens, e não deixar que eles usem você". Ah, eu aplaudo a coragem de Frank Capra, por fazer um filme deste em plena década de 30! Vejam a cena no vídeo abaixo:


O discurso que o personagem faz a Lily resume toda a questão: se tudo que um homem quer de uma mulher é o sexo, então o sexo é o principal recurso que uma mulher pode ter para conseguir alguma coisa dele. Isto valia ainda mais na época em que a mulher não podia trabalhar, estudar ou ser reconhecida pelas suas habilidades e inteligência. Hoje, o paradigma mudou, a mulher conseguiu respeito e direitos, mas ainda assim, a sociedade é praticamente dominada por homens, e ainda há mulheres que usam o sexo para aproveitar-se deles.

Mulheres usam sexo para conseguir o que querem. Mas esta assertiva não deve ser interpretada levando-se em consideração apenas o lado fútil, superficial e ambicioso da mulher.

Vamos encarar as coisas de uma maneira bem simplista e generalizada: se é verdade, como pontuado pela personagem de "Macho Man", que "mulher não quer sexo; mulher quer homem", poder-se-ia também dizer que "homem não quer mulher; homem quer sexo" (mais uma vez, digo: estou partindo de uma perspectiva simplista e generalizada! É claro que tudo não se resume a isto, estas não são verdades absolutas e há exceções). E uma vez estando a mulher ciente disto, ela usa o sexo para conseguir o amor de seu homem. 

Isto pode explicar o porquê de tantas mulheres fingirem orgasmos.

Mulheres são carentes e têm medo de ficarem sozinhas (repito: estou generalizando!). Usam o sexo para conseguirem um relacionamento, e depois, para mantê-lo. Têm medo de perder seu homem, e por isso, dão a ele o que ele quer: sexo, mesmo quando ela não está com vontade.

Certa vez li no site Yahoo uma reportagem falando sobre mulheres que fazem greve de sexo. O cientista entrevistado, ao iniciar suas pesquisas, partiu da seguinte questão: Afinal, a mulher faz sexo com o namorado porque gosta de fazer sexo, ou só para agradá-lo? Ele não foi explícito, mas pude entender que a segunda alternativa é a correta. Se sexo agradasse a mulher tanto quanto agrada ao homem, ela não se privaria dele apenas para conseguir alguma coisa de seu parceiro. Se está confortável em ficar sem sexo até que o parceiro ceda, é porque não gosta tanto assim de sexo.

E por que será que não gosta? Deixando de lado qualquer explicação de cunho científico, pois não possuo conhecimento específico sobre isso, eu poderia dizer que mulheres gostam menos de sexo porque não se sentem completamente livres e bem resolvidas em relação ao sexo. Por este motivo, homens gostam mais de sexo que mulheres: porque fazem sexo sem culpa, não se sentem mal em gostar. Mulheres associam sexo a tantas coisas que torna-se complicado apreciar o sexo de forma total. 

"O homem faz sexo e fica satisfeito; a mulher faz sexo e fica insegura", dizia a personagem de Marisa Orth em "Macho Man". "Eu, por exemplo, sempre fico insegura, pensando se fingi direito", retruca a outra personagem. Este diálogo, por mais que tenha aparecido no seriado apenas para divertir o telespectador, retrata a forma como a mulher vê o sexo: como forma de agradar seu parceiro. Por isso, a mulher simula desejo, finge orgasmo, faz um verdadeiro teatro em cima da cama. Ela cria um personagem que, segundo crê, satisfará seu homem. 

Isto pode ter duas explicações: ou a mulher não possui autoestima suficiente para ter a coragem de ser si mesma e expor o seu verdadeiro eu na hora da relação da sexual; ou sabe que é seu homem que tem problemas de autoestima e não suportaria saber que não conseguiu proporcionar prazer a ela. 

Vou analisar as duas possibilidades.

Às vezes, a mulher é tão insegura e tem tanto medo de se mostrar como é, que precisa fingir. Para conquistar o homem amado, ela constrói uma outra personalidade. Como acaba conseguindo o homem, infere que precisa manter o disfarce, para manter o homem também. Tem medo de estragar o relacionamento e por isso continua com a "farsa". Na hora do sexo, teme revelar-se, teme que sua pose desmonte na frente do ser amado, e então, mantém o disfarce até o fim, fingindo ser aquilo que fingiu desde o começo. É nesta hora que a mulher finge ser muito mais safada e ousada do que verdadeiramente é, ou pelo contrário, finge ser recatada e certinha. Finge de acordo com a imagem que quer passar.

A outra possibilidade é a que envolve a insegurança do homem. O gozo e a ejaculação, para o homem, representam o prazer máximo, o cume do sexo. Se o homem goza, é porque o sexo valeu a pena. Com a mulher é diferente: o sexo pode ser extremamente prazeroso sem que ela goze, afinal, o sexo para a mulher diz respeito a todo o corpo, e não apenas ao órgão sexual. Mas os homens não sabem disso... Acham que tudo se dá da mesma forma. Por isso, quando ela não goza, ele se sente fracassado, sente que não cumpriu seu papel. Na intenção de preservar seu parceiro desta sensação de fiasco, a mulher finge o orgasmo. 

Li um interessantíssimo e excelente artigo de Ivan Martins para o site da Revista Época no qual ele fala sobre mulheres que fingem orgasmo. A parte que mais chamou a minha atenção é aquela em que ele afirma: "Meu ego aguenta uma mulher que não goze". A questão é justamente esta! Nem todo homem possui autoconfiança suficiente para lidar com isto. E aí resta à mulher preencher este vazio dele, dar solução ao seu problema de autoestima. Por isso ela finge orgasmo - algumas dizem inclusive que fingem não só o orgasmo, mas o sexo inteiro.

Alexander Lowen, em sua obra "Amor e orgasmo", discorre sobre isso de uma forma interessante quando disserta acerca da popularização da palavra "desempenho", ao descrever o ato sexual: 

"Deveríamos prestar atenção à própria menção do termo 'desempenho' em relação ao sexo. Desempenho sugere a execução de um ato de modo tal que consiga atrair a atenção do outro para uma habilidade ou para um talento artístico por parte de quem teve esse desempenho. (...) O desempenho é  avaliado segundo padrões externos a quem o realiza. (...) O ato sexual é um desempenho se for usado mais para impressionar o próprio parceiro do que para expressar algum sentimento próprio. É um desempenho se a satisfação do outro for de importância maior que a própria satisfação." (1988: p. 12 e 13)

Por isso as mulheres fingem tantas coisas na hora do sexo. Quer desempenhar-se bem, quer agradar o homem, e nisto, acaba perdendo o contato com a própria emoção, e por isso, ao fim do sexo, fica feliz por ter conseguido satisfazer o parceiro, mas também sente que não foi tão prazeroso para ela quanto poderia ter sido.

Será por isso que tantas mulheres possuem uma vida sexual insatisfatória? Eu creio que sim. A mulher vê o sexo como muitas coisas, e não como aquela que é a principal: prazer e realização pessoal. 

A mulher não se permite vivenciar o sexo da maneira que proporciona maior prazer a ela. É diferente - ela  vivencia o sexo da maneira que propicia a vantagem que ela quer do sexo: o amor de seu homem, o dinheiro, ou o que for. 

Durante séculos, o sexo foi o mais eficiente meio de uma mulher conseguir obter alguma coisa. E a mulher assimilou essa ideia de sexo como recurso de tal modo que não consegue mais ver o sexo como fonte de realização.

Em suma, eu poderia dizer que enquanto o sexo for visto pela mulher como obrigação, mecanismo, moeda de troca ou qualquer outra coisa do tipo, ela não vai se sentir plenamente realizada. 

Os homens têm culpa nisso, sim. Durante séculos, usaram a mulher como instrumento de descarga de sua tensão sexual, ignorando-as como seres humanos completos, dotados de opinião própria ou sentimentos. A mulher precisou se defender disto, ou melhor, usar isto a seu favor.

Contudo, nem por isto deve a mulher descontar exclusivamente nos homens sua frustração por não ser sexualmente saudável e contente. A mulher pode - e deve, caso queira ser feliz e esteja interessada em fazer seu homem também ainda mais feliz no sexo - livrar-se de culpas, medos e inseguranças, e enfim, enxergar no sexo uma fonte de prazer e felicidade. Só quando ela tiver essa coragem, conseguirá sentir-se completa, sexualmente falando.

Nenhum comentário: