terça-feira, 12 de julho de 2011

Jazz: paixão irreversível

Hoje, logo pela manhã, uma casualidade me proporcionou o contato com a voz de rouxinol de Dinah Washington... Ah, escutá-la me fez lembrar o porquê de eu gostar tanto de jazz.


Eu tinha cerca de 12 anos de idade quando me apaixonei pelo jazz. A paixão pelos ritmos derivados e afins, como o rhythm and blues e o soul, foram uma consequência. E a paixão por filmes clássicos foi o início de tudo.

Peggy Lee cantando no
filme "Pete Kelly's blues"
As coisas se deram desta forma: foi exatamente nessa época que eu me apaixonei por cinema em preto e branco - só esta historieta já merece um texto à parte para este blog. Entre tantas coisas nestes filmes que me deixavam extasiada, encantavam-me as canções. Mesmo em filmes que não eram musicais, era comum que a atriz principal cantasse alguma coisa. Eu não costumava gostar de canções assim, mas naquele contexto, funcionava perfeitamente. Como soavam lindas as melodias nas vozes daquelas divas tão lindas! Logo depois descobri que nem sempre a voz que eu ouvia pertencia às atrizes, mas nem por isso deixei de admirar as canções.

Lembro-me, por exemplo, de Ava Gardner, no filme de 1948, "Vênus, a deusa do amor", como uma versão encarnada da deusa, cantando, linda e sedutora: "Fale baixo quando falar de amor"... Confiram no vídeo abaixo, por volta doe 1min40s:





Era tudo tão mágico! As atrizes cantavam com uma elegância, uma delicadeza, um brilho nos olhos... Ademais, as canções eram dotadas de uma poesia, de uma ingenuidade... Tudo era muito sutil e inocente. Não havia como não se encantar!

Das telas para os CDs, fui me interessando cada vez mais pelo jazz das décadas de 1930 a 1960. Entre muitas pesquisas, conheci a minha primeira ídola do jazz: Ella Fitzgerald. Com sua voz de veludo e suas interpretações intensas, Ella me fascinou com "Night and day", "Someone to watch over me", "But not for me" e tantas outras performances incríveis.




Depois conheci Jane Monheit, e através de sua música, descobri que o jazz não precisa ser cantado por alguém que já morreu, em uma gravação antiga e com ecos, para ser bom. A primeira canção dela que escutei foi "Something to live for". Fascinou-me a melancolia da letra, a melodia suave, o instrumental simplório e a voz macia e original de Jane. Logo quis conhecer melhor a sua obra, e então deparei-me com várias interpretações incríveis de grandes clássicos. A minha favorita é a sua versão de "Dindi", do nosso Tom Jobim, carioca que fazia "jazz brasileiro" como ninguém, e de cuja obra também acabei virando fã.




Depois de Jane Monheit vieram Diana Krall, Norah Jones, Jamie Cullum... 
Voltando ao passado, conheci também Julie London, Nina Simone, Frank Sinatra... 
Descobri alguns artistas pop que também são uma maravilha cantando jazz (Rod Stewart lançou 5 deliciosos álbuns de grandes clássicos do cancionário jazz norte americano - os chamados standards -, e Carly Simon também gravou "Moonlight serenade", um álbum totalmente dedicado ao jazz)... 
... E pronto! Estava arrebatada. Eu era uma garotinha de 12, 13 anos, reclusa em meu quarto escutando jazz. É, eu reconheço que nunca fui uma criança ou adolescente como as outras.


O que mais me fascinava, aliás, fascina, no jazz, é a sensação de nostalgia e classe que ele passa. Não há como não ouvir aquelas gravações antigas, com arranjos bem feitos, e não me sentir automaticamente transportada à década de 40, por exemplo. E, para alguém que se apega aos sentimentos nostálgicos com tanta intensidade quanto eu, esta sensação é deleitosa. 


Ademais, jazz é muito, muito chique. Mesmo nas mais extravagantes e escandalosas canções, tudo é feito com muita finesse. Não importa se a canção é mais emotiva ou alegre: a elegância é a mesma. 


Eis outra particularidade do jazz: ele pode ser enérgico ou calmo. Adoro os jazzes mais alegres, no maior estilo do entretenimento noturno das grandes cidades, adoro a miscelânea de sons emitidos por trompetes - instrumentos de sopro sempre me fascinaram. De outro lado, também fico deslumbrada quando ouço as baladas, sempre carregadas com tanta emoção, tanta melancolia, tanto sentimento.


Jazz fascina. Surgiu nos Estados Unidos e, por décadas, foi o único ritmo deste país: em toda parte, só se ouvia jazz. Talvez por isso ele tenha desenvolvido essas duas vertentes: a alegre e a melancólica. O ritmo precisou mesmo se desdobrar para atender toda a demanda de pessoas famintas por música.


Outrossim, por ter predominado e praticamente monopolizado a cultura de música e dança nos Estados Unidos entre as décadas de 1920 a 1950 (pois já no final dos anos 50 começam a surgir outros ritmos, como o doo wop e o rock'n'roll), talvez por isso represente tão bem a essência daquela época. 


É uma pena que, por preconceito contra tudo que vem de "antigamente", os jovens da atualidade se recusem a conhecer este portento que é o jazz! Até entendo; afinal, os dias de hoje pedem músicas com instrumental mais sofisticado e aparelhado, com mais apelo comercial, menos enrolação e mais ação. Tudo bem, também gosto disso. Todavia, ainda assim, no meu coração há um espaço especial reservado para os grandes clássicos! 


Nada melhor, para finalizar este texto, que deixar uma pequena playlist com alguns exemplares muito gostosos deste ritmo que, apesar de todo o meu esforço, não consegui descrever com palavras. Não é tarefa fácil definir jazz com palavras, e talvez nem seja necessário: jazz é para ser escutado e sentido, de preferência com a alma aberta e o coração tranquilo.


Dinah Washington - What a difference a day makes
Nina Simone - You've got to learn
Lou Rawls e Dianne Reeves - At last

Nenhum comentário: