segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Considerações sobre a nova presidente eleita

Dilma Rousseff foi eleita com 56% dos votos válidos e, independente de qual tenha sido meu voto, desejo que faça um bom governo e que tenha sensatez e equilíbrio ao tomar suas decisões.

É sempre emocionante acompanhar as grandes mudanças, políticas ou não, pelas quais a nossa sociedade passa. A perspectiva de que tudo que agora estou vivendo constará nos livros de história dos meus filhos é, no mínimo, emocionante (não consigo encontrar outra palavra que descreva melhor este sentimento).

Tenho duas ponderações a fazer, uma boa e outra que considero péssima.

A primeira é a respeito da repercussão internacional gerada pelo resultado desta eleição. Vários líderes mundiais têm se manifestado favoravelmente à vitória de Dilma e têm se comprometido a estar do lado do Brasil neste momento de grande fortalecimento.

Só para citar alguns nomes: o venezuelano Chavez foi extremamente carinhoso ao comentar a eleição de Dilma, chamando-a inclusive de “querida”; a recém viúva Christina Kirchner, presidente da Argentina, saudou a nova presidente dizendo que ela agora faz parte do “clube de companheiras do gênero”; Ahmadinejad, presidente do Irã, aposta na manutenção de laços de amizade entre seu país e o Brasil; Barack Obama, dos EUA, parabenizou Dilma e chamou sua vitória de “histórica”.

O jornal New York Times enxergou a vitória de Dilma como um desejo do povo de continuar com as políticas sociais e econômicas de Lula.

Ao escolher Rousseff, que não tem nenhuma experiência em cargos eletivos, em vez de José Serra, os eleitores enviaram a mensagem de que preferem dar ao governista Partido dos Trabalhadores mais tempo para ampliar as bem-sucedidas políticas econômicas de (Lula) Da Silva, cujo governo aprofundou a estabilidade econômica e tirou milhões de brasileiros da pobreza para a classe média baixa’, diz o texto.
A reportagem diz ainda que Dilma se une à crescente onda de mulheres democraticamente eleitas na região e no mundo nos últimos cinco anos, entre elas Michelle Bachelet (ex-presidente do Chile), Cristina Kirchner (presidente da Argentina) e Angela Merkel (chanceler alemã).



Sem dúvidas, é uma bela maneira de iniciar um mandato. Tudo indica que Dilma terá muito apoio por parte dos outros países e da imprensa de todo o mundo.
 
Todavia, sabemos que boa parte disto se deve ao trabalho do presidente Lula, que construiu uma imagem muito positiva perante a comunidade internacional. Não será fácil substituí-lo, Dilma precisará de muita sabedoria, firmeza de caráter e uma boa equipe para auxiliá-la.


Mas não é este o comentário negativo que pretendo fazer. Muito embora a eleição de uma mulher possa ser o mais contundente indício de que o povo brasileiro não é machista, tenho observado uma atitude muito preconceituosa em relação à nova presidente. Trata-se das piadinhas a respeito da (falta) de beleza de Dilma Rousseff.

Em 121 anos de República, nunca tivemos um presidente bonito e isto nunca foi motivo de conversa ou chacota. Este ano, com a candidatura de Dilma, inúmeras foram as zombarias e anedotas criadas por humoristas envolvendo a feiúra da presidente. Sabemos que não foi a primeira vez que uma mulher se candidatou à Presidência, porém, nunca uma mulher havia tido tantas chances de vencer, como de fato Dilma venceu.

Piadinhas no Twitter
Mas afinal, por que é mesmo que uma candidata a presidente precisa ser bonita? Ah, porque é mulher, claro. É assim que a sociedade pensa. Não adianta ser inteligente, trabalhadora, boa profissional, boa mãe, isso, isso, isso e aquilo... Tem que ser bonita também. É isso que a sociedade espera de nós, mulheres; afinal, foi opção nossa sair de casa e ir trabalhar fora, buscar realização e reconhecimento fora do lar. O papel de dona de casa, mãe, esposa e objeto sexual continua, não se pode fugir disto. É assim que pensam hoje. Não, o machismo não foi derrotado, não ainda.

Não estou atribuindo a culpa inteira aos homens, pois sei que há mulheres tão machistas quanto eles. Prova disto é que Dilma teve dificuldade de angariar votos femininos. Vejam esta reportagem publicada no mês de julho:

A pesquisa mais recente do Ibope, divulgada em 4 de julho, mostrou Dilma empatada com seu principal adversário, o tucano José Serra, ambos com 39% dos votos. Marina Silva (PV) apareceu com 10%. No corte por gênero, a petista tem 34% de preferência entre as mulheres, contra 41% de Serra. A situação se inverte entre os entrevistados do sexo masculino, com 44% para Dilma e 36% para Serra.

A diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari, lembrou que historicamente o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, principal cabo eleitoral de Dilma, também teve uma preferência menor do eleitorado feminino do que seus adversários. Ela ponderou, no entanto, que ainda é cedo para dizer se Dilma também herdará do presidente essa característica eleitoral. Segundo Márcia Cavallari, não há nas pesquisas sinais de que as eleitoras deixam de votar em uma mulher por preconceito, até porque a imagem das políticas em geral é positiva por elas "terem preocupação com a área social, lidarem bem com o dinheiro, serem organizadas e menos corruptíveis".

Além disso, explicou a executiva do Ibope, as mulheres decidem mais tarde em quem depositarão seus votos e são mais sensíveis a temas que têm impacto direto na vida familiar, como o abastecimento de água em casa, saneamento básico, educação dos filhos e sistema de saúde. "As mulheres têm uma simpatia melhor pelo candidato José Serra por remeter a ele a questão de quando ele era ministro da Saúde, com os genéricos", comentou.

A mais recente pesquisa do instituto revelou que 9% das mulheres estão indecisas, contra 5% de homens que não souberam responder quando perguntados se votariam em Serra, Dilma ou Marina.

Desde a redemocratização, apenas quatro mulheres se candidataram à Presidência. A ex-senadora Heloisa Helena (PSOL) foi até agora a que teve melhor desempenho. Em 2006, ela atingiu 6,85% dos votos válidos.


(texto retirado do site Olhar Direto; http://www.olhardireto.com.br/noticias/exibir.asp?edt=41&id=115880; acesso em 01/11/10, às 18h15)

E, esquecendo as pesquisas e dando foco ao nosso próprio cotidiano, reparei que a maioria das pessoas que cultivavam verdadeira aversão à candidata Dilma (independente do fato de ela ser do PT ou ser “pupila” do presidente Lula) eram mulheres. Vi vários homens criticando Dilma, listando razões pelas quais acreditavam que ela não faria um bom governo, e até falando que ela é feia, mas não vi nenhum mencioná-la com tanto asco como faziam as mulheres.

Sei que é maldade, mas tenho mesmo que registrar: boa parte das mulheres que referiam-se pejorativamente à candidata Dilma faziam o estilo submissa e servil aos homens. Provavelmente estavam mordidas de desgosto por verem uma mulher alcançar o poder, uma mulher que ousou viver uma vida além de sua própria cozinha. 

Mas, de qualquer forma, as pessoas falam o que querem, e como a própria Dilma disse em seu discurso, este é o preço que se paga para que haja liberdade e direito de expressão. 

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