quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Duas coisas a respeito do caso Mayara Petruso

Política é um assunto que me interessa, mas evito opinar, porque não sou grande conhecedora. Geralmente os apaixonados por política entendem profundamente do assunto, conhecem a história do nosso país e sabem fazer relações entre uma coisa e outra. Ademais, entender de política requer muita perspicácia, qualidade esta que ainda estou tentando aprimorar. Logo, para evitar falar do que não sei ou correr o risco de cometer injustiças, prefiro falar pouco sobre o assunto, preferindo ler e ouvir a respeito.

Todavia, há fatos sobre os quais não podemos quedarnos silentes.

Através do texto “O pior de nós”, publicado no blog Cotidiano Gonzo, o qual eu sigo (e recomendo!), tomei conhecimento da enxurrada de mensagens de cunho preconceituoso e racista que foram vinculadas por meio do Twitter em momentos posteriores à eleição da presidente Dilma. Inconformadas com a vitória da petista, várias pessoas (em sua maioria, adolescentes, pelo que me consta) dispararam a atacar os nordestinos, culpando-os não somente pelo resultado das eleições, como também por diversos males que assolam o Brasil. 

Mesmo tendo as ofensas partido de várias pessoas, foi a estudante de Direito (!) paulista Mayara Petruso quem virou ícone deste “movimento”, devido às suas declarações raivosas: “Nordestino não é gente”; “Dêem aos nordestinos o direito de voto e afundem o Brasil”, entre outras. A Secção da OAB no Estado do Pernambuco já se pronunciou inclusive no sentido de oferecer a notitia criminis (notícia-crime) ao Ministério Público Federal, a fim de que Mayara seja condenada pelos crimes de racismo e incitação ao crime. 


Não entendi ainda como Mayara virou a mártir da história toda e por quê apenas ela está na mira das atenções, mas de qualquer forma, duas coisas chamaram muito a minha intenção, em relação a tudo isso.

A primeira, certamente, é o tom dos comentários proferidos pelos adolescentes  revoltados com a vitória de Dilma. Eu entendo que, no calor do momento, a irresignação por seu candidato Serra não ter vencido deve ter sido tão grande que os levou a falar todas essas coisas; mas mesmo assim, há ódio demais nas frases, em cada palavra, até no modo de escrever, cheio de maiúsculas (na linguagem da Internet, o uso de maiúsculas equivale a gritos). Muita ira, muita mesmo.


Nos blogs 31 de Outubro e Heart Beatz há várias amostras do que estou dizendo: pessoas "twittando" coisas terríveis, pesadas de verdade; há até quem tenha a coragem de sugerir a exterminação dos nordestinos.

O curioso desta história é o seguinte: Dilma venceria a eleição mesmo sem os votos do Norte e do Nordeste. Já foi apurado; é o que diz a reportagem de Eliano Jorge publicada no Terra Magazine no dia seguinte à eleição:

Pessoas descontentes com a eleição da petista Dilma Rousseff atribuíram aos eleitores da região Nordeste peso decisivo no resultado do segundo turno, neste domingo (31). Porém, os nordestinos apenas aumentaram a vantagem que a futura presidente obteve no resto do País. Considerando apenas Norte, Centro-Oeste, Sul e Sudeste, ela somou 1.873.507 votos a mais do que o tucano José Serra.
E, antes que novos discursos discriminatórios - canalizados contra o Nordeste na internet - se direcionem a outro alvo fácil, o Norte, vale destacar que Dilma também ganharia a eleição sem o saldo positivo de 1.033.802 votos com que os nortistas lhe agraciaram.
O Sudeste, idealizado pelos críticos de nordestinos e nortistas como bastião do PSDB, deu à petista 1.630.614 eleitores a mais do que seu adversário. Esta quantidade supera em 839.695 votos a soma das vantagens que Serra teve no Sul, 656.485, e no Centro-Oeste, 134.434.
Embora o candidato tucano tenha acumulado 1.846.036 votos a mais do que Dilma em São Paulo, ele perdeu no segundo e no terceiro maiores colégios eleitorais do País, Minas Gerais e Rio de Janeiro, respectivamente com saldo negativo de 1.797.831 e 1.710.186.


Complementando o elemento curioso: Dilma também venceu no Distrito Federal, Minas Gerais e Rio de Janeiro, não apenas nos Estados do Norte (nesta região, entretanto, Dilma não foi a mais votada em todos os Estados: Serra venceu em Roraima e no Acre) e Nordeste. A culpa, portanto, não pode ser jogada apenas nos nordestinos, uma vez que os citados Estados do Sudeste e mais o Distrito Federal constituem colégios eleitorais bastante expressivos (os de MG e RJ são, respectivamente, o segundo e o terceiro maiores colégios eleitorais do Brasil).

Créditos da imagem: portal UOL
Não é de hoje que os Estados da região Nordeste são conhecidos por seus grandes índices de anafalbetismo, miséria, mortalidade infantil e violência; mas nenhum destes fatos pode servir de fundamento para tamanho bairrismo.

Os comentários preconceituosos partiram de moradores das regiões Sul e Sudeste, em especial dos paulistas, que inclusive popularizaram a tag #orgulhodeserpaulista no Twitter. É lamentável que estas pessoas passem ao resto do Brasil a imagem de que se sentem superiores, quando sabemos que:
- nem todo morador do Sul e Sudeste é assim; existem sim pessoas muito boas, decentes e respeitosas nestas regiões;
Contudo, infelizmente estas pessoas pagarão o preço de serem confundidas com as demais.
- foi este tipo de sentimento que justificou o surgimento do movimento nazista.
E o mais preocupante é ver que tudo isto está partindo de jovens! Não se trata de uma ditadura que fazia lavagem cerebral nas pessoas, como era no tempo de Hitler; trata-se de jovens que estão tomando estas atitudes por si mesmos, porque querem, querem discriminar.

Eu poderia (e até gostaria de) comentar muitas coisas negativas acerca destes adolescentes, mas estaria caindo no mesmo erro que eles: desrespeitando, discriminando, generalizando.

É muito, muito triste ver este tipo de comportamento justo aqui, justo no Brasil, no país mais misto de todos, no país em que nós nos orgulhamos de dizer que todas as etnias, credos e culturas convivem tão bem.

Eu já havia postado aqui no blog um texto no qual afirmo que o grande problema do Brasil está na mentalidade das pessoas, e em um momento como agora esta premissa me parece ainda mais adequada e verdadeira. Quando escrevi aquele texto não estava me referindo a atitudes de preconceito e racismo, mas as palavras cabem perfeitamente para esta ocasião também.

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A segunda coisa que chamou a minha atenção nesta polêmica toda foi, sem dúvida, o impacto das coisas que fazemos por impulso, ou sem pensar – principalmente quando estas coisas são feitas por meio da Internet.

Eu tenho certeza que a estudante Mayara Petruso jamais imaginou que seus comentários tivessem tamanha repercussão. Se tivesse controlado um pouquinho mais seus impulsos, não teria escrito o que escreveu.

Sem mencionar todos os outros indivíduos que postaram insultos semelhantes. No afã de expressarem sua cólera, saíram digitando tudo que lhes vinha à cabeça, sem pensar nas consequências. Ou será que pensaram? Será que fariam tudo de novo? Será que tinham noção de que estavam cometendo crimes ou agiram com ingenuidade? Será que simplesmente pensaram que sairiam impunes, assim como tantos criminosos em nosso país?

Eu tenho minhas dúvidas; porém, de qualquer forma, convém a todos nós “colocarmos as barbas de molho”: nós que temos blog, ou orkut, MSN, facebook, twitter, skoob e afins. Às vezes, uma palavra dita ou uma expressão mal pensada podem ter consequências desastrosas, por menos maldosas que tenham sido nossas intenções.

 
Para fechar este texto, uma última notícia: a presidente Dilma Rousseff ficou em 16° lugar numa lista feita pela Forbes para enumerar as pessoas mais poderosas do mundo (a notícia completa está em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,dilma-e-escolhida-a-16-pessoa-mais-poderosa-do-mundo-pela-forbes,634546,0.htm; acesso em 04 de novembro de 2010, às 16h30). 

É uma excelente colocação e eu espero que não gere mais revolta, mas pelo contrário, espero que nos entusiasme a apoiar a nossa presidente – pois independemente de ela ter sido eleita com ou sem o nosso voto, o fato é que foi eleita, vai governar, e temos que torcer para que governe da melhor maneira possível. 


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