quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A homossexualidade feminina e a masculina: uma análise à luz da mídia e da cultura pop


O personagem Kurt Hummel, interpretado por Chris Colfer (indicado ao Emmy deste ano), na série Glee, sempre sofreu por ser homossexual, mas nesta segunda temporada seu sofrimento tem me tocado mais, em especial no terceiro episódio, em que ele passa por um problema que nem envolve sua opção sexual, mas em alguns momentos isto vem à tona. De outro lado, as cheerleaders Brittany e Santana são bissexuais (durante toda a primeira temporada isto ficou meio implícito, mas agora na segunda está bem claro, já mostraram até cenas das duas juntas), e entretanto, levam isso numa boa.

Esse disparate fez-me pensar na questão da homossexualidade feminina e da masculina. Sem dúvida, a homossexualidade de uma forma geral é hoje muitíssimo mais bem vista do que era há tempos atrás. Tudo isto se deve não somente à luta dos grupos homossexuais e à conscientização da sociedade, mas também à grande influência da cultura pop; Madonna foi praticamente uma pioneira desbravando este terreno. E é sobre isto que gostaria de propor uma reflexão: tenho reparado que a homossexualidade feminina é mais aceita que a masculina. Por quê?

Antes de aprofundar-me, quero deixar claro que não fiz grandes pesquisas para escrever sobre isto, tampouco pretendo que este texto seja um artigo científico; trata-se de apenas pontos de vista meus, e posso cometer erros e até me esquecer de algumas coisas. Se alguém quiser corrigir ou acrescentar algo, sinta-se à vontade para entrar em contato comigo.

Também preciso salientar que meu enfoque será dado mais para a cultura pop dos Estados Unidos do que para a do Brasil, haja visto que aqui a indústria da música e do entretenimento funcionam de uma maneira um pouco diferente.

Vamos lá: a impressão que eu tenho é que as mulheres têm se sentido mais confortáveis em assumir suas opções sexuais do que os homens, e creio que posso associar isto à popularização e, por que não dizer?, à glamourização da homossexualidade feminina.

Citei Madonna porque sinceramente não saberia nomear outra figura na música e no showbusiness que tenha difundido com tanta intensidade a ideia de que as pessoas devam ser livres para vivenciar suas próprias experiências e serem verdadeiras acerca disso, nem outra que tenha obtido tamanho êxito à sua época. Talvez no cinema tenha havido: eu citaria Marlene Dietrich, a linda e intrigante alemã que, ainda nos conservadores anos 30, polemizou ao aparecer vestida de homem no filme "Marrocos" e beijar uma moça na boca. 

É claro que a homossexualidade não é um fenômeno recente, aliás, nem é um fenômeno, é uma opção sexual mesmo. Mas acho que a imprensa nunca encarou a questão com tanta normalidade como tem feito após o surgimento de Madonna, e ademais, acho que as mulheres têm sido privilegiadas. Há menos homens assumidamente homossexuais, e pouquíssimos se atrevem a usar isso em seus vídeos e músicas - eu acho que não saberia dizer o nome de nenhum!

Vejamos como a mídia pós-Madonna está repleta de referências ao lesbianismo:

* Melissa Etheridge assumiu-se lésbica e anunciou seu namoro com a atriz de "Popular", Tammy Lynn Michaels. Hoje, ela está casada com a atriz Portia De Rossi.

* Ellen de Generes é uma das apresentadoras mais queridas e bem-sucedidas

Mais recentemente... 
    

* Britney e Madonna lançam o single "Me against the music" (2003), cujo vídeo quase tem uma cena de beijo no final
 
* Novamente Britney e Madonna, e desta vez unidas a Christina Aguilera, abrem o VMA 2004 com um medley de "Like a virgin" e "Hollywood", e no meio da apresentação, Madonna beija as duas moças na boca

* Em 2008, Katy Perry estoura com o single "I kissed a girl"

E, por fim... 

* Surge Lady GaGa, causando uma reviravolta no mundo da música pop e alçada ao posto de novo ícone do movimento gay

Esses dias atrás li também uma declaração da Christina Aguilera dizendo: "Meu marido sabe que gosto de garotas", e acho que Cameron Diaz também já se pronunciou a respeito.

O que eu percebo é que: Lady GaGa já apareceu namorando uma mulher, Lindsay Lohan assumiu-se lésbica, Ellen de Generes é muito querida e respeitada... Mas e os homens? Por que para eles não parece ser tão fácil assim? Por que nenhum destes casos que eu mencionei fez tanto alarde quanto um único caso de revelação de homossexualidade masculina, como por exemplo, o de Ricky Martin? Será que faltou, na cultura pop norte-americana, uma figura masculina forte como Madonna para levantar esta bandeira?

Aqui no Brasil as coisas não são tão glamourizadas porque a MTV tem menos influência, os videoclipes não fazem tanto sucesso, nossa cultura pop é fraca e o mundo do entretenimento é muito mais alimentado pelas revistas de celebridade e pelos canais de TV aberta - e isto não é uma crítica, só estou descrevendo o nosso cenário que, aliás, em alguns pontos acho muito melhor. Na música e na TV, acho que a homossexualidade é vista com mais respeito, até porque houveram e ainda há artistas de peso, respeitados e talentosos que são/foram assumidamente homossexuais, como Ney Matogrosso, Ana Carolina e os falecidos Cazuza e Cássia Eller; enquanto que nos Estados Unidos, atualmente, as polêmicas giram mais em torno de celebridades, cantores e atores que, não obstante tenham talento, utilizam mais a própria imagem e a indústria do showbizz para alcançarem sucesso.

Minha intenção, com este texto, não é apontar erros e acertos na cultura de cada país, mas apenas levantar esta discussão sobre a homossexualidade feminina, para a qual a sociedade e em especial a imprensa está muito mais receptiva que para a homossexualidade masculina. Citei cultura pop porque me interessa e porque acho que pode ser um fator decisivo nesta questão, mas pode ser que haja outros motivos - e pode até ser que seja impressão minha, que tanto homens quanto mulheres tenham liberdade para assumirem-se como são.

A parte mais triste é que existem muitos homens escondendo sua opção sexual até mesmo da própria família, por vergonha ou medo de não serem aceitos. A virilidade masculina é hoje muito mais valorizada e exigida que a própria feminilidade nas mulheres, e acho que isto se deve ao fato de as mulheres terem conquistado espaço no mercado de trabalho. É okay uma mulher vestir-se como homem, de terno, calças, sapato fechado, ou cortar os cabelos curtos; mas o contrário é inadmissível, a sociedade rechaça. Nesta seara, vale a pena colar aqui um trecho de uma canção da própria Madonna, "What it feels like for a girl", que está no álbum "Music", lançado em 2000:

"Girls can wear jeans
And cut their hair short
Wear shirts and boots
Cause it's okay to be a boy

But for a boy to look like a girl is degrading
Cause you think being a girl is degrading"

Em português, e em uma tradução livre feita por mim mesma:
"Garotas podem usar jeans e cortar os cabelos curtos, usar camisas e botas, porque é normal ser um garoto. Mas, para um garoto, parecer uma garota é degradante, porque você pensa que ser uma garota é degradante"


E mesmo quando a homossexualidade restringe-se à escolha do parceiro, não deixando transparecer em nada na forma de agir ou vestir-se, os homens mais uma vez saem prejudicados. Lady GaGa, Britney, Madonna, Lindsay Lohan e tantas outras famosas passam a noção, nos videoclipes ou na vida real, de que uma mulher lésbica não é necessariamente uma mulher com trejeitos masculinos, e pode muito bem ser bastante feminina. Mas e os homens? Vejo tão poucos gays que não sejam afeminados - e certamente não é porque eles não existem, mas porque não se assumem. Um exemplo é o próprio Ricky Martin: mesmo sendo gay, acho ele bastante másculo, mas infelizmente muitos discordam de mim, simplesmente porque ele dança rebolando, como se mexer os quadris fosse exclusividade das mulheres.


A legislação brasileira não admite o casamento civil gay, mas a sociedade felizmente tem se mostrado cada dia menos preconceituosa. O preconceito vem diminuindo... mas ainda existe, e percebo que tem atingido muito mais os homens que as mulheres.

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